Aventura para todos os públicos
Cristiano Goldschmidt
Quando um espetáculo infantil não consegue agradar às
crianças, dificilmente agrada ao público adulto, quando conquista as crianças,
nem sempre atrai a atenção dos adultos, e quando cativa a ambos, é porque há
ali um trabalho dedicado e cuidadoso com o conjunto de todos os elementos que
compõem uma montagem cênica.
Junho: uma aventura imaginária (apresentado na tarde de
ontem no Teatro Carlos Carvalho dentro da programação do 3º Festival Estadual
de Teatro do Rio Grande do Sul – FESTE), do Coletivo Nômade, de Gravataí (RS),
é dessas encenações produzidas para encantar públicos de todas as idades.
Thiago Silva, que assina o texto e a direção, entrega ao espectador um
espetáculo que desde a primeira cena nos convida a embarcar na história do
menino Junho (Jardel Rocha) e da família Frank. Aventura, fantasia, curiosidade
e descoberta estão presentes do início ao fim, prendendo a atenção do público
infantil, que constantemente reage aos acontecimentos e com eles interage,
respondendo aos desdobramentos da cena.
Com o objetivo de protegê-lo do mundo exterior e de uma
possível maldição, Junho Frank é um menino que vive enclausurado no castelo de
sua família. Sob os extremos cuidados da mãe, Judith Frank (Alessandra Bier), e
da tia, Morgana Frank (Jennifer Ribeiro), o garoto dedica seus dias à leitura de
livros, e sua curiosidade com o mundo faz com que ele apenas possa imaginar as
cores e as texturas da natureza e da vida existentes para além dos muros que o
protegem.
Dentre tantos acertos, um dos méritos da montagem é o
incentivo à leitura. Junho adora ler, sonha em poder viajar e “visitar
bibliotecas incríveis e cheias de mistérios”. Com a entrada do seu tio Cosme
(Roger Santos) em cena, que retorna de uma viagem, Junho vive grandes
aventuras. Contra a vontade de Judith e Morgana, Cosme dá de presente ao
sobrinho um livro misterioso que conta a história da família Frank ao longo dos
séculos. Mas, o que esconde o livro da família Frank? Cheio de enigmas, é na
leitura deste livro que Junho encontra suas próprias origens, descobrindo em
suas páginas a história da maldição da família.
As aventuras se intensificam quando Jazz (Ana Carolina de David) e
Maya (Hayline Vitória) entram no castelo da família Frank através de uma passagem secreta.
Com as novas amigas, Junho descobre o mundo para além das fronteiras do
castelo. Viajando no tempo, ele encontra sua mãe num passado distante, quando
ela tinha a idade que ele tem no presente, e o clima de suspense toma conta de
todos quando Jazz, Maya, Junho e Judith são capturados por Antenor (Roger
Santos) e Teobaldo (Leonardo Steffanello). Aliás, se existe um equilíbrio entre
a atuação de todos, destaco o trabalho de Roger Santos, que certamente ainda
nos presenteará com atuações que lhe renderão muitos convites e críticas
positivas. E aqui é importante dizer que o elenco é formado por excelentes
atores e atrizes que, ao que tudo indica, já possuem uma trajetória e estão
acostumados com os palcos.
Mesmo que seja uma peça infantil, há algumas mensagens endereçadas
e entendidas exclusivamente pelo público adulto. Com bom humor, incluem
críticas ao momento histórico atual de nosso país. Se a história de Junho nos
mostra, entre outras coisas, que os livros nos ajudam a entender o passado para,
se necessário, mudarmos o futuro, Antenor e Teobaldo também estão ali para nos
mostrar que os livros são sempre uma ameaça aos que tem algo a temer.
Se o texto é bom e as atuações sempre imprescindíveis para o
sucesso de qualquer montagem, não restam dúvidas de que o cuidado e o
profissionalismo dispensados ao figurino (de Jardel Rocha), à maquiagem e à
caracterização (de Jardel Rocha e Jennifer Ribeiro), à trilha sonora (de Régis
Moewius e Handyer Borba), à iluminação (de Ariel Medeiros), à cenografia e aos
acessórios (de Roger Santos) também contribuem para que Junho: uma aventura
imaginária arrebate os espectadores, ganhando-os do início ao fim do espetáculo.
Crédito da foto: Giuliano Bueno