Pelo conjunto de suas qualidades, Teima Filho, Teima que Dá emociona o público
Cristiano Goldschmidt
Na noite do último dia 4 de
dezembro, a peça Teima Filho, Teima que Dá, do Grupo de Estudos Teatrais deGravataí, abriu a 4ª edição do Festival Estadual de Teatro do Rio Grande do Sul
(FESTE), que acontece no Teatro Bruno Kiefer da Casa de Cultura Mario Quintana.
Considero importante
registrar que o Grupo de Estudos Teatrais de Gravataí (GET) existe há apenas um
ano, o que nos impõe a necessidade de um olhar cuidadoso quanto à análise do
espetáculo. No entanto, isso não nos impossibilita de apontar suas qualidades,
tampouco as falhas a serem revistas. Teima Filho, Teima que Dá
emociona o público pelo conjunto das qualidades da montagem, cuja direção leva
a assinatura de Izabel Cristina, também responsável pela dramaturgia,
livremente inspirada nas obras Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo
Neto, e Vidas Secas, de Graciliano Ramos.
Além da acertada e
impactante trilha sonora, destaco a riqueza do cenário da artista plástica e
cenógrafa Cristina Lenz, que, em diálogo com o texto e com a direção, soube
reproduzir o agreste brasileiro sem deixar de contemplar a aridez encontrada em
diferentes pontos geográficos deste imenso país. No cenário, folhas secas,
cadáveres bovinos, caixas gradeadas que também servem de cela, objetos
religiosos – o terço e a santa católica que demonstram a força da fé que está
sempre presente; símbolos das religiões de matriz africana –, tudo isso forma
um conjunto de elementos que representa a cultura e a vida de um povo que sabe
que a morte está sempre à espreita.
Dez jovens atores e atrizes
demonstram no palco boa preparação corporal, domínio do texto e do espaço
cênico, embora ajustes sejam necessários neste último aspecto. Foram pequenas
as lacunas constatadas ao longo de quase uma hora de peça, o que pode ser
perfeitamente resolvido com a maior atenção dos atores e com a experiência da
diretora. Aliás, enquanto a experiência e o domínio da técnica de alguns se
sobressai, as deficiências e as fragilidades de outros também se evidenciam. Talvez a inexperiência ou a
falta de uma maior atenção e preparo com a voz (dicção e entonação) tenham dificultado
para o espectador, em alguns momentos, a compreensão do texto. São pequenos
detalhes que, no meu entendimento, podem ser melhorados. Fazendo esses pequenos
ajustes, o grupo pode aperfeiçoar um resultado que já vem dando bastante certo.
Para além dessas questões,
percebemos um elenco que se entrega à atuação. Estão todos em sintonia,
demonstram sentir-se à vontade no palco. Não há ali amadorismo – no sentido da
falta de engajamento, de irresponsabilidade ou de descomprometimento dos atores
–, e as pequenas falhas que apontei talvez sejam fruto da crueza de alguns,
algo a ser melhorado com o trabalho a ser desenvolvido ao longo do tempo.
Certamente poderia fazer
uma análise mais aprofundada sobre a atuação de cada ator ou atriz, mas isso
nem sempre é possível – às vezes por falta de tempo e espaço –, ainda mais em
uma peça com dez atores e atrizes em cena. Porém, sem querer ser injusto com os
demais, gostaria de chamar atenção para a atuação de Eulália Figueiredo (de
apenas 15 anos), que demonstra qualidades e habilidades que certamente a
conduzirão para novos trabalhos. E aqui me refiro mais especificamente ao poder
hipnotizante de sua voz. É um talento que precisa ser reconhecido e
incentivado.
Outro ator que chama atenção é Jackson Reis, um ator com enorme potencial a ser desenvolvido. Embora tenha suas limitações (Jackson é deficiente físico), chama atenção sua entrega e habilidade em contorná-las, atuando de igual para igual com seus parceiros de cena do início ao fim da peça. Percebe-se que tanto a diretora quanto os colegas não subestimaram suas qualidades e potencialidades.
Espetáculo questionador,
com uma narrativa que nos mostra que a injustiça muitas vezes começa no
nascimento, Teima Filho, Teima que Dá não apresenta somente a difícil sina do
emigrante: questões contemporâneas como a violência contra a mulher, a
homofobia e o racismo também estão em cena. Dores, dificuldades, pobreza,
exploração, miséria humana e morte formam um conjunto de questões que fazem com
que o espectador saia do teatro refletindo sobre o real sentido da vida. E
embora a fé esteja presente, por tudo o que nos é dado a ver, a presença divina
parece estar bem distante.
Crédito da foto: Carolina
Zogbi
Desejo parabenizar o Cristiano pela lavra de um texto crítico tão sensível e culto. Seu olhar sobre o espetáculo abordado não somente ilumina aspectos da interpretação e da direção, como também aos olhos do público leigo, suscitará em quem a sua crítica ler, a vontade de assistir o espetáculo.
ResponderExcluirMissão delicada, fazer sua crítica ser importante para quem do processo artístico participa e a missão de informar o público em geral(pessoas leitores neutras em relação ao espetáculo) com o intuito de que se torne platéi
a.
Me parece também importante afirmar como é importante para o FESTE praticar esse exercício da escuta através de uma voz qualificada.
Plínio Mósca.